No decorrer do trabalho, percebendo meu apego aos cães, ele se dirigiu a mim, comentando sobre a fidelidade que se consegue com tal amigo e me contou uma história.
O ano ele não sabia, nem direito o tempo, mas lembrava que havia acontecido com seu avô, quando este ainda era jovem e solteiro. Este avô lhe contara que possuía um irmão caçula que havia se aventurado para Mato Grosso, e que não recebia notícias havia anos sobre o paradeiro de tal irmão. Imaginando o pior teve a idéia de fazer uma viagem até lá para então procurá-lo.
Preparou a melhor sela que tinha, algumas roupas, um pouco de dinheiro na guaiaca, o facão, e comprou duas mulas para ir revezando a montaria até lá. Depois de semanas viajando nas mulas, com sacrifício e persistência encontrou o irmão morando num rancho pobre, com alguns capatazes e criando algumas cabeças de gado. Estava passando fome e embora quase abandonados no meio do mundo ainda tinham saúde e esperança de prosperar.
Ele então permaneceu com eles alguns dias e percebendo que não havia comida para todos resolveu então voltar para o Rio Grande do Sul, levando agora notícias melhores. Durante a despedida o irmão lhe pediu que deixasse uma das mulas, pois seria de grande valia para seu trabalho no campo já que não tinham nenhum outro animal para transporte. E meio chateado, pois a viagem de retorno seria muito mais lenta com só uma mula, acabou se sensibilizando e deixou o quadrúpede para o irmão. Naquilo o tal irmão foi até os fundos do galpão e voltou trazendo numa corda um cusco, meio magro, de pêlo opaco e lhe entregou, dizendo que este cachorro era em troca da mula preciosa que havia lhe deixado.
Percebendo a sinceridade acabou aceitando o animal para não magoar o irmão que lhe passou o cão com bastante confiança. Logo após a partida, soltou a corda do cachorro e o mandou cuidar da própria vida, mas o canídeo continuou seguindo-o deixando-o ainda mais indignado.
À noite, dormindo embaixo de uma árvore, perto da estrada, ele acordou com algo gelado pressionando a sua testa, e quando abriu os olhos percebeu um vulto em sua frente com uma espingarda tocando o seu frontal, e uma voz grossa pedindo para passar o dinheiro. Sem poder se mexer muito puxou a carteira da cintura e jogou bem longe, dizendo para o larápio: “ pega bandido!”
Imediatamente vindo da escuridão, o cachorro pulou no pescoço do agressor afastando-o do seu novo mestre que mais que depressa levantou, pegou a espingarda do bandido, apontou para o cara e sem pensar muito terminou com o ameaçador ali mesmo. Então, respirou fundo, analisou o que aconteceu..., pegou a corda..., amarrou no cachorro..., prendeu a outra ponta na sela da mula... e veio embora.